domingo, 25 de setembro de 2011

FOGO ENGOLE TUDO - DE NOVO

Meu marido escreveu no blog dele em agosto de 2007. Hoje, quatro anos depois, a história se repete. A Serra do Curral é, neste momento, uma cortina de fogo e fumaça. Corpo de bombeiros a postos, sem muito o que fazer. E a bicharada calcinada de novo. E a montanha inteira é transformada num só túmulo.
Mudou governador; mudou prefeito; mudou o ano. O que não mudou foi a providência definitiva pra tragédia ambiental não se repetir. Por quê?
E desta vez não teve meninos soltando pipas pra levarem a culpa.

07/08/2007

"A vegetação, neste inverno seco, era um palheiro esperando fagulhas.

Há dois anos o sistema de irrigação e proteção contra incêndios deixou de funcionar. E ficou assim.

Antes, esguichava água todas as tardes e todas as manhãs; durante 5 anos não ocorreram incêndios.

A MBR, mineradora que hoje pertence à Vale – e que devastou a parte anterior da Serra do Curral para extrair minério – responsável pela instalação e manutenção do sistema no alto da montanha - informou que ele não funcionou por conta de uma pane elétrica.

Mentira, já não funcionava há muito tempo. Mas nós ficamos calados.

Os bombeiros disseram que jovens, buscando recuperar pipas, atearam o fogo.

Eram jovens num Festival de Pipas promovido pela Prefeitura de Belo Horizonte, na Praça do Papa.

Não sei. Foi uma coluna de fogo - de alto a baixo da montanha - repentina, furiosa pelo vento. Repentina. Não me pareceu coisa de jovens desavisados, desconfio, mas não afirmo contra.

Em vinte horas, 85% da mata virou cinza.

A Serra do Curral é o Corcovado de Belo Horizonte, vastos alqueires de montanha cobertos de vegetação, habitados por pequenos mamíferos – muitas espécies de roedores, micos, quatis - répteis, aves de toda espécie como beija-flores, canários e azulões; aves de rapina grandes e pequenas, os elegantes gaviões, corujas buraqueiras, urubus-rei. Todos perderam seus ninhos e filhotes nos alpendres de pedra da montanha de onde, todos os dias, levantavam seus vôos de variada qualidade.

O capim alto, pendoado em vermelho no outono e amarelo ressequido neste inverno, verde e lindo nas primaveras; vegetação característica do cerrado, arbustos, muitos pinheiros nos contrafortes baixos. E as orquídeas? Minúsculos pontos coloridos na escarpa. Nada mais, só esqueletos e cinza.

Desgosto.

Tudo agora está preto, calcinado, pedras negras espetadas como túmulos, silêncio dos pássaros, cheiro de animais em decomposição, de carne queimada. O vento carrega o cheiro brando da morte para dentro de nossas casas, empesteia o nariz de quem caminha no Anel da Serra.

Moro de frente para a montanha. Basta atravessar a rua e, ali mesmo, começa a erguer-se o monumento natural mais belo da cidade.

Dois quarteirões atrás fica o palácio das Mangabeiras, residência do governador de Minas Gerais, Aécio Neves.

Se ele estava lá na noite do dia 5, deve ter presenciado a tragédia. Mas ficou calado.

O prefeito da cidade, Fernando Pimentel, se viu, também se calou.

Jornais e Tvs receberam alguns alertas, não se manifestaram.

Nós, moradores, nada fizemos para prevenir a tragédia anunciada, reclamamos entre nós do inverno ressequido, da falta de esguichos da MBR/Vale.

Reclamamos em casa, lamurientos, mas não tomamos qualquer atitude.

A associação do Bairro foi inoperante, fomos inoperantes, não nos mobilizamos, alertamos, e o seco inverno transformou a Serra do Curral num fogueira de 20 horas que nos cobre a todos de vergonha.

Ao final, a culpa ficará com uns garotos que soltavam pipa."

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